Na escola tinha um menino que era cheio de fama. Era bonitinho, jogava futebol bem, tinha olhos verdes bem iluminados, e quando eu fiquei sabendo que ele existia ele estava estudando no terceirão – o que torna a pessoa ainda mais bonita quando você é mais nova, e eu estava na oitava série. Todo ano tinha alguém bonitinho do terceirão, e aquele era o ano desse menino. Não era exatamente uma paixão para mim. A minha filosofia era mais do tipo “nem te ligo” – provavelmente era uma maneira de me defender do fato de que possivelmente ele não saberia da minha existência ou admiração tão cedo.
Anos mais tarde eu já tinha saído do colégio, tinha vivido meu terceirão e descobria muito lentamente essa coisa de ficar com alguém, mas já tinha vivido uma paixonite clássica. Meu primeiro coração partido aconteceu quando eu tinha quase 17 anos, quando o menino dos meus sonhos disse que me ligaria e nunca ligou. Fiquei uma semana colada no telefone – porque na época só o telefone de casa era fonte de contato – mas a ligação nunca veio e foi bem ruim ter que aceitar que, literalmente, ele não ligava pra mim.
Era verão quando tudo isso aconteceu, eu mal esperava gostar de alguém denovo – porque em paixonites o mundo “acaba”, mas topei com o menino de olhos verdes do colégio e lembrei quem ele era. O meu “nem te ligo” estava ativado até ele vir falar comigo e dizer que lembrava de mim da época da escola. Isso foi como um “abre-te Sésamo” do meu coração. Não demorou muito para ele me ligar, como prometido, e nós saímos duas vezes. Eu queria namorar, mas ele não. Como eu tinha esperança perguntei o que tinha acontecido e ele, com muita leveza e objetividade, disse que estava gostando de outra pessoa – que tinha acontecido e que não queria me machucar, nem confundir a história toda.
Demorei duas semanas para digerir aquilo. Primeiro para aceitar que eu nunca namoraria com ele, depois para compreender tamanha honestidade e aprender uma lição poderosa de feedback.
Com o que muita gente poderia traduzir como frieza, ele tinha sido cristalino. E isso foi importante para que eu entendesse que coisas assim acontecem e que não existe culpa ou o que eu pudesse fazer para conquistar um coração já tomado. Passado as duas semanas eu conservava por ele admiração e carinho, não alimentava esperança e conseguia manter a amizade. Meu respeito cresceu porque ele não fugiu da conversa. Me ajudou a crescer e a seguir, sem ilusões – e isso foi realmente saudável para minha experiência e para me dar coragem de ser mais clara com as coisas.
Meu irmão usa uma expressão para traduzir quem só fala o que queremos ouvir, que alimenta nosso ego e nos mantém iludidos sobre nossas reais capacidades. Ele fala que são os “yes, man!” – que para tudo dizem “você é o máximo”, “vou te ligar”, “um dia eu faço”… Acontece que sem a realidade não temos clareza de ação, e nos sentimos paralisados. E por essas relações, particularmente, eu não tenho disposto de tempo.
O feedback honesto é uma virtude dos que amam acima das paixões. Dizer a verdade, com discrição e leveza, acreditando na capacidade que o outro tem de seguir em frente demonstra compaixão – e esse valor mudará o mundo, muito em breve.
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Até mais.