Quando eu era criança, com uns 6 ou 7 anos fui até o laboratório para fazer um exame de sangue. Eu me sentia forte. Era uma criança destemida. Lembro da aula de ciências: eu dissecava ratinhos e sapos – muitíssimo embora hoje eu não aceitasse fazer nenhum experimento com bichos de qualquer espécie – naquela época eu era pequenina e orgulhosa da minha coragem.
Tirar sangue não me parecia um problema. Fui vigorosa caminhando na direção do laboratório. Meu pai foi comigo, e a minha mãe ficou esperando no carro. Me disseram que era rápido, que não doía nada e que seria só uma “picadinha”.
Sei que muita gente sente que não dói nada mesmo, que passa, de fato, bem rápido, que logo a vida volta ao normal – tem quem doa sangue numa boa – eu admiro, incentivo e aplaudo e, um dia, chego lá!
Acontece que a partir daquele dia “picadinha” virou um conceito bem individual e subjetivo: colocaram o elástico no meu braço, e eu quis olhar a agulha – pra demonstrar firmeza e um “estou tranquila” para o meu pai, falaram a frase épica da picadinha e eu só fui acordar um tempo depois. Quando abri os olhos, enjoada, assustada e perdida, escutei um: Vanessa?! Vanessa?! e, cercada de umas 15 pessoas, vi meu pai e minha mãe – que apareceu porque demoramos muito. Eu passei mal mesmo e, de lá para cá, não curto muito, nem acho muito simples, essa coisa do exame de sangue. *A única vantagem, confesso, foi depois do rolo, tomar um leite morno com umas bolachinhas gostosas e ganhar uns mimos extras dos meus pais, que me “cafunezaram” muito.
Entretanto, os fiascos aconteceram outras vezes. Nem me fale da injeção de B12 que me fez capotar na farmácia do bairro. Achei que tinha superado o lance dos desmaios, fui na farmácia – isso no ano passado – e disse: “me vê uma injeção de B12”! Coloquei poder na voz, respiração firme, foco na superação e tudo – mas parei no pronto-socorro e demorei uma hora e meia para ter minhas batidas do coração no ritmo normal outra vez. Errei feio. Fui sozinha, querendo me convencer de que já dava conta. Quase aceitei que minha dor era pequena demais para pedir por companhia.
Sentia um constrangimento – agora já me acostumei comigo mesma – quando pedia para tirar sangue deitada, de pernas pra cima, com minha mãe-irmão-noivo-pai-amigo segurando a minha mão e fazendo piada pra desviar o assunto. Hoje quando preciso passar pelo medo sinto que, pelo menos, desenvolvi meu próprio jeito de enfrentá-lo – e tiro sangue – rápido mesmo, e nem dói mais tanto assim. Pernas pra cima, mãos dadas, let´s go piadas. Manda ver a picadinha. Acabo sobrevivendo.
Nenhum enfrentamento é fácil. E não podemos esperar que seja. Dor e medo são a mesma coisa para todos nós.